Piccolo Corpo

Piccolo Corpo

Estreia:

de Laura Samani

Itália, França, Eslovénia, 2021, 1h29, Classificação M/12, Drama

com Celeste Cescutti, Ondina Quadri

Festivais e Prémios:

Festival de Cannes 2021 | Semana da Crítica
TIFF - Toronto International Film Festival 2021 | Selecção Oficial
BFI London Film Festival 2021 | Selecção Oficial
David di Donatello 2022 | Prémio para Melhor Primeira Longa-metragem
Annecy Italian Film Festival 2021 | Prémio do Público
Festival du Film Italien de Villerupt 2021 | Menção Especial do Júri
Busan International Film Festival 2021
European Film Awards 2022 | Prémio FIPRESCI
Sydney Film Festival 2022 | Selecção Oficial 
Sarajevo Film Festival 2021
Stockholm International Film Festival 2021 | Selecção Oficial
Cairo International Film Festival 2021 | Competição Internacional; Pirâmide de Prata; Prémio Especial do Júri
Festival de Sevilla 2021 | Selecção Oficial, secção Extraordinary Stories
Torino Film Festival 2021

Filme Vencedor 14ª Festa do Cinema Italiano

Ficha técnica:

Realização Laura Samani
Produtores Nadia Trevisan, Alberto Fasulo
Co-produtores Thomas Lambert, Danijel Hočevar
Argumento Marco Borromei, Elisa Dondi, Laura Samani
Direcção de fotografia Mitja Ličen
Direcção de Arte Rachele Meliadò
Montagem Chiara Dainese
Guarda-roupa Loredana Buscemi
Música original Fredrika Stahl
Desenho de som Riccardo Spagnol
Produção Nefertiti Film with Rai Cinema
Co-produção Tomsa Films and Vertigo
Distribuição em Portugal Risi Film

«Um filme surpreendentemente belo. [...] Um conto de fadas de traços rudes que se desenrola num mundo totalmente realizado, esta é uma estreia cativante da realizadora Laura Samani.» Wendy Ide, Screendaily


«Com Piccolo Corpo, Samani criou uma obra de grande maturidade e poder. É um filme sobre uma dor pessoal que gradualmente, passo a passo, adquire uma ressonância mítica. Trata-se de um talento novo e vibrante que deve ser observado.» John Bleasdale, Cine-Vue | ★★★★


«Um talento poético e estético.» Mateus Tarwacki, Eyeforfilm


«Piccolo Corpo é uma estreia assegurada para Samani, cujo estilo delicado e luminoso ecoa a leveza de toque em Corpo Celeste e The Wonders da também cineasta italiana Alice Rohrwacher» Meredith Taylor, Filmuforia


«A bela estreia de Laura Samani.» Camillo De Marco, Cineuropa


«Uma jóia que faz jus à glória do cinema italiano.» Rodrigo Fonseca, Estadão


«Um filme misterioso e ambíguo, com momentos muito encantadores.» Diego Lerer, Micropsiacine


«A longa-metragem de estreia de Laura Samani é um conto de fadas cinematográfico: duro, desgastado e como um pedaço de madeira à deriva… Há cenas e locais fantásticos neste filme, que tem o ar de uma parábola mágica, como uma obra de Alice Rohrwacher. Pensei até que poderia haver um pequeno toque de Breaking the Waves, de Lars von Trier… A linguagem cinematográfica de Samani tem consistência e urgência, e há um interessante traço de ateísmo que acompanha a aura espiritual deste filme.» Peter Bradshaw, The Guardian | ★★★★


«Uma história profundamente interessante e comovente.» Umar Ali, The Upcoming | ★★★★


«Um belo filme, cheio de vida e de maravilha… Piccolo Corpo é uma pequena obra-prima do cinema moderno.» Rob Aldham, Backseat Mafia


«Ambicioso e bem-sucedido… Este drama centrado nas mulheres tem a sensação de uma demanda mítica.» Tom Dawson, Total Film | ★★★★


«O visual assombroso do filme, as bandas sonoras esparsas e o compromisso vulnerável com a verdade tornam-no um filme essencial.» Jasmine Valentine, Flickering Myth | ★★★★


«Viajar nesta odisseia com Agata evoca verdades tão profundas que é impossível não nos identificarmos com ela. E a forma como Samani desenrola a narrativa, como um conto de fadas mágico-realista, torna a conclusão sombriamente comovente.» Rich Cline, Shadows On The Wall | ★★★★


CNews | ★★★★★

Críticos do FIPRESCI | ★★★★

Bande à part | ★★★★

Cahiers du Cinéma | ★★★★

Femme Actuelle | ★★★★

Franceinfo Culture | ★★★★

L'Humanité | ★★★★

Le Journal du Dimanche | ★★★★

Les Echos | ★★★★

Les Fiches du Cinéma | ★★★★

Les Inrockuptibles | ★★★★

Libération | ★★★★

Paris Match | ★★★★

Télérama | ★★★★

Laura Samani nasceu em 1989 em Trieste. Depois de se licenciar em Filosofia e Literatura na Universidade de Pisa, estudou realização no Centro Sperimentale di Cinematografia (Roma).

A sua curta-metragem de fim de curso, La santa che dorme (2016), que partilha a mesma dupla de argumentistas de Piccolo corpo, estreou na Cinéfondation do Festival de Cannes, tendo figurado em outros três festivais internacionais. Desde então, tem vindo a ganhar reconhecimento internacional e vários prémios em diversos festivais internacionais.

Em 2018 trabalhou para a Associação Maremetraggio, conduzindo o workshop de vídeo participativo Città Visibile, financiado por Siae Bando SIllumina - Periferie Urbane in Valmaura, Trieste. Trata-se do primeiro laboratório deste género realizado em Trieste, que envolveu adolescentes que vivem em situação de marginalidade social com o objetivo de realizar um documentário auto-narrativo.

Piccolo corpo, um conto de fadas cru, é a sua primeira longa-metragem.

Este ano está a preparar L’estate è finita - appunti su furio, uma curta-metragem de cerca de 15 minutos sobre uma viagem na memória de uma mulher que acabou de terminar a relação com o seu namorado Furio.

Nota de Intenções


Em 2016 descobri que em Trava, na minha Friuli Venezia-Giulia, existia um santuário onde, até ao século XIX, se dizia que ocorriam milagres particulares: que crianças nado-mortos podiam ser trazidas de volta à vida pelo espaço de um fôlego. Um milagre como este era necessário para para poder baptizar estes bebés que, de outra forma, estariam condenados a ser enterrados em terrenos não consagrados, como quem enterra um gato morto. Sem o baptismo, nunca poderiam ter um nome nem uma identidade; as suas almas vagueariam eternamente no Limbo.
Este tipo de lugares chamam-se à répit, ou santuários de alento ou de tréguas, e estiveram presentes em todos os Alpes (só em França havia quase duzentos) e é surpreendente que esta história seja quase totalmente desconhecida, apesar da dimensão do fenómeno.


A história destes milagres ficou presa nalgum recanto da minha mente e ficou lá, a pedir atenção. Um pormenor em particular chamou-me a atenção: eram sobretudo os homens que se deslocavam a estes santuários com os pequenos corpos dos seus bebés. Naturalmente, as mulheres que acabavam de dar à luz estavam confinadas às suas camas, mas eu não conseguia deixar de ver a espera impotente a que estavam sujeitas.

A primeira pergunta que fiz aos co-argumentistas, Elisa Dondi e Marco Borromei, que decidiram acompanhar-me nesta minha viagem, que começou com La santa che dorme, foi: o que é que acontece à mulher na cama? E se, em vez disso, for ela que decide partir?
Assim começámos a escrever com apenas duas certezas: ela é Agata, e esta é a sua primeira gravidez.
Quando o bebé nasce morto, Agata fica de luto, mas não consegue simplesmente seguir em frente, como toda a gente à sua volta parece fazer. Para mim, a melhor parte de uma história é aquele momento em que uma personagem decide insurgir-se. A escolha de Agata é praticamente escandalosa porque denota orgulho e protesto, não só contra a sua religião, mas também contra as leis da natureza.


Há um momento preciso, geralmente à noite, em que as possibilidades que temos diante de nós parecem, de repente, consistir apenas numa escolha e é então que o destino é feito. Agata decide ouvir as vozes que falam dos milagres.
Seguindo o seu instinto e sem dizer a ninguém, parte numa viagem com o seu bebé numa pequena caixa. Sozinha.
Obviamente, a prática da ressuscitação de bebés não era vista com bons olhos pela Igreja, porque era um abuso dos sacramentos e uma prática semelhante à bruxaria.


Agata empreende uma viagem aos confins do desconhecido, abandonando as suas raízes e arriscando-se a perder-se a si própria e a morrer. O seu desejo consciente é dar um nome à filha para poder deixá-la partir, ambos indivíduos distintos mas a verdade é que esta viagem é uma forma de prolongar o estado de simbiose com a filha, que Agata viveu durante meses - uma espécie de continuação da gravidez, em que o bebé é transferido da barriga para as costas, tornando-se um peso que ela carrega nos seus ombros.
A sua viagem é física, mas torna-se transcendental. Agata não se apercebe de que, para continuar a sua missão, tem de se transformar, tornar-se morta entre os vivos.

Agata precisava de um companheiro de viagem e foi assim que nasceu a personagem Lynx: selvagem e astuto, fechado a todos, porque amar é comprometer-se, enfraquecer-se. Lynx mostra o caminho a Ágata, oferecendo-lhe proteção, mas o que ele receberá dela em troca é algo igualmente necessário à sobrevivência: o profundo sentimento de apego a algo que se ama; o compromisso, o sacrifício, o sentimento de pertencer a algo que não se pode controlar e que nos torna vulneráveis. Graças a Agata, Lynx reencontra-se com essa parte que é o arquétipo do lado feminino, que tem a coragem de aceitar o lado negro do amor: a dor.


Embora tenha situado o filme na minha terra natal, este enraizamento no território não significa que esta história seja apenas desse lugar. Penso que as histórias são as mesmas em todo o lado. Filmei numa continuidade cronológica, empreendendo o mesmo tipo de viagem que Agata faz, desde a lagoa de Caorle e Bibione até às montanhas de Carnia e Tarvisiano. Este filme cresceu connosco e nós crescemos com ele.
Enquanto pesquisava os locais, conheci as pessoas que se tornaram personagens do filme, ou talvez tenha sido o contrário, uma vez que nenhuma delas pode ser considerada sem a outra. Quase todo o elenco é composto por pessoas que nunca tinham representado antes; em alguns casos, famílias inteiras. É também por esta razão que decidi rodar o filme nos dialectos do Veneto e do Friuli; não apenas para providenciar a língua autêntica da época, respeitando as diferentes variações para que as pessoas se pudessem exprimir da forma mais natural possível.

O processo de imposição de um italiano estandardizado começou na segunda metade de 1800 e continuou durante o fascismo, uma operação política para permitir o controlo do território que causou um enorme empobrecimento cultural mas, felizmente, não conseguiu extinguir totalmente a grande variedade de idiomas. Penso que o dialeto é um enriquecimento precioso e muitas vezes comovente: basta notar que a palavra para “criança” no dialeto do Friuli é fruto, porque uma criança é o fruto dos seus pais.


Por várias razões e muitas vezes sem relação com a história em si, todas as pessoas envolvidas encontraram algo de si na história e nos seus temas. É por isso que acabamos muitas vezes a falar mais da vida do que do cinema, e a aprender uns com os outros: às vezes era eu que os dirigia e, noutros momentos, eram eles que me guiavam. A transversalidade é a melhor forma de criar.
No filme, Deus não se encontra nos milagres ou nas orações, ou em dogmas que dividem a vida após a morte em paraíso, inferno e limbo. Deus existe a um outro nível: em Lynx, que não acredita em nada e, portanto, não é afetado pela premissa inicial dos milagres; em Agata, que usa a raiva para redesenhar os limites do que é possível; e na relação entre estas duas visões solitárias que, por um momento, são menos dolorosas.

Há uma linha ténue que divide a vida da morte, a realidade da magia, as possibilidades que esperamos e o tempo que nos resta. Espero que este filme crie um maior espaço de partilha sem a presunção de encontrar respostas absolutas para vivermos juntos na dúvida.